sexta-feira, 26 de maio de 2017

Lava Jato e Trava Jato


A guerra do Brasil tem basicamente dois lados: a elite política e o povo. Atualmente, quase todas as instituições públicas, com maior ou menor fidelidade, prestam serviços à máfia que nos governa há três décadas. Uma das poucas forças institucionais que se identificam com os anseios da população e os valores da Pátria é a Operação Lava Jato. Mesmo ela, no entanto, foi dividida em dois setores antagônicos, tão diferentes quanto a água e o óleo.
Hoje temos duas Lava Jatos: a de Curitiba e a de Brasília. A de Sergio Moro e a do STF. A de Dallagnol e a de Janot. A que os filhos do Brasil gostam e a que os filhos da CUT gostam. Na verdade, as operações mereceriam dois nomes distintos: Lava Jato e Trava Jato.
A Lava Jato é apoiada pela população. A Trava Jato é apoiada pelos políticos. A Lava Jato prende figurões. A Trava Jato deixa os figurões em liberdade. A Lava Jato botou o maior empreiteiro do País na cadeia. A Trava Jato libera Joesley para passear em Nova York. A Lava Jato prende figuras de todas as tendências ideológicas (até o Cunha!). A Trava Jato prende só alguns, e solta rapidinho. A Lava Jato passa o Brasil a limpo. A Trava Jato de vez em quando acerta — como fez ao revelar as conversas sombrias de Temer e Aécio —, mas está longe de possuir a operacionalidade de sua coirmã curitibana.
Eu diria que a Trava Jato e a Lava Jato são tão diferentes entre si quanto Caim e Abel, Esaú e Jacó, Dr. Jekyll e Mr. Hyde. Joio e trigo. Água e óleo. Brasília e Curitiba. O Estado e o povo brasileiro. O empresariado honesto e o empresariado que vive de sugar o dinheiro público.
Diante da fuga do réu da Trava Jato para curtir as delícias da Broadway e do Central Park, eu só tenho um sentimento: vergonha. Vergonha que é expressada nas palavras do jurista João Carlos Biagini: "No plano econômico, o grupo de Joesley há tempos estava prejudicando o mercado ao estabelecer, com a ajuda governamental, um monopólio nacional da carne, com a eliminação, através da compra com dinheiro do BNDES, de quase todos os concorrentes. E, agora, tomamos conhecimento de ter se tornado internacionalmente o maior operador no mercado da carne, portanto com o dinheiro dos contribuintes brasileiros". À vergonha de origem econômica, somou-se a vergonha moral da gravação feita nos porões do Jaburu, na calada da noite.
A última da Trava Jato foi provocar a demissão de um jornalista que, goste-se ou não dele, teve publicamente exposto o diálogo com uma fonte — no caso, a irmã de Aécio Neves —, numa clara tentativa de intimidação da imprensa. É como se as "otoridades" estivessem dizendo: "Aqui não, violão!".
Há uma luta de vida ou morte entre a Lava Jato e a Trava Jato. E dessa guerra depende a sobrevivência do País.

Artigo de Paulo Antônio Briguet, publicado originalmente em 26.05.2017  -(http://www.folhadelondrina.com.br)

segunda-feira, 12 de dezembro de 2016

O AMOR TEM UM LIMITE QUE SE CHAMA DIGNIDADE

O amor sempre terá um limite: a dignidade. Porque o respeito que cada um de nós temos por nós mesmos tem um preço muito alto e jamais irá aceitar cortes para saciar um amor que não é suficiente, que machuca e nos deixa vulneráveis.

Dizia Pablo Neruda que o amor é curto e o esquecimento é muito longo. Mas no entremeio sempre há aquela “luz de vagalume” que se acende de forma natural nas noites escuras para nos indicar onde é o limite, para nos lembrar que é melhor um esquecimento longo do que uma grande tormenta na qual acabamos vendendo a nossa dignidade.

“Às vezes o melhor remédio é esquecer o que se sente para recordar o que valemos. Porque a dignidade não deve ser perdida por ninguém, porque o amor não se roga nem se suplica, e embora nunca se deva perder um amor por orgulho, também não se deve perder a dignidade por amor”.

Acredite ou não, a dignidade é esse elo frágil e delicado que tantas vezes comprometemos, que pode romper e desfazer as ligações dos nossos relacionamentos amorosos. Há muitas ocasiões em que cruzamos essa fronteira sem querer até nos deixarmos levar por alguns extremos nos quais nossos limites morais tornam-se fracos, pensamos que por amor tudo vale a pena e que qualquer renúncia é pouca.

Porque o amor e a dignidade são duas correntes em um oceano convulso, no qual até mesmo o marinheiro mais experiente pode perder o rumo.
Muitas pessoas costumam dizer que o ego alimenta o orgulho e o espírito alimenta a dignidade. De qualquer forma, estas duas dimensões psicológicas são duas habitantes cotidianas das complexas ilhas de relacionamentos amorosos, que às vezes costumam ser confundidas.

O orgulho, por exemplo, é um inimigo bem conhecido que costuma ser associado ao amor próprio. No entanto, ele vai um passo além, pois o orgulho é um arquiteto especializado em levantar muros e cercas nos nossos relacionamentos, em decorar cada detalhe com arrogância e em encontrar o vitimismo em cada palavra. Apesar de todos estes atos destrutivos, o que realmente está mascarado é uma baixa autoestima.

Enquanto isso, a dignidade é justamente o contrário. Ela age o tempo todo a ouvir a voz do nosso “eu” para fortalecer o ser humano mais belo, o respeito por nós mesmos sem esquecer o respeito pelos outros. Aqui o conceito do amor próprio adquire o seu pleno significado, pois se alimenta dele para se proteger sem prejudicar os outros: sem causar efeitos “colaterais”, mas validando em todos os momentos a própria autoestima.

A dignidade não se vende, nem se perde nem se presenteia. Porque uma derrota a tempo sempre será mais digna do que uma vitória se conseguirmos sair “inteiros” dessa batalha, com o queixo erguido, o coração inteiro e uma tristeza que vai acabar renovando as esperanças.

“As pessoas costumam pensar que não há nada pior do que ser abandonado por alguém que amamos. Não é verdade, o mais destrutivo é se perder amando quem não nos ama”.

No amor saudável e digno não se encaixam martírios ou renúncias, aquelas em que dizemos que vale tudo só para estarmos ao lado do ser amado. Não adianta nos posicionamos à sua sombra, onde já não irão mais restar dias ensolarados para o nosso coração nem estímulos para as nossas esperanças.

Por isso, e para evitar cair nestas correntes emocionais convulsivas, vale a pena refletir sobre as seguintes questões, que sem dúvida podem nos ajudar:

1) Nos relacionamentos amorosos os sacrifícios têm limites. Não somos obrigados a responder a todos os problemas do nosso parceiro/a, a oferecer ar sempre que ele/a quiser respirar, nem a apagar a nossa luz para que a dele/a brilhe. Lembre-se de onde está o verdadeiro limite: na sua dignidade.

2) O  amor se sente, se toca e se cria todos os dias. Se não percebermos nada disto, pedir não vai adiantar nada, assim como não adianta esperarmos sentados que aconteça um milagre que não tem sentido. Assumir que já não somos amados é um ato de valentia que vai evitar que fiquemos à deriva em situações delicadas e destrutivas.

3) O amor jamais deverá ser cego. Por muito que se defenda esta ideia, é necessário lembrar que sempre será melhor se oferecer a alguém com os olhos bem abertos, o coração entusiasmado e com a dignidade muito alta. Só então seremos autênticos arquitetos destas relações dignas que valem a pena, onde pode-se respeitar e ser respeitado, criar todos os dias um ambiente saudável onde nem “tudo vale”, sem jogos de poder nem sacrifícios irracionais.

A dignidade é e será sempre o reconhecimento de que somos merecedores de coisas melhores, porque sempre será melhor uma solidão digna do que uma vida de carências, do que relacionamentos incompletos que nos fazem acreditar que somos atores secundários no teatro da nossa existência. Não permita isso, não perca a sua dignidade por ninguém.



(Fonte: Blog O Segredo - https://osegredo.com.br/2016/09/o-amor-tem-um-limite-que-se-chama-dignidade/)

segunda-feira, 19 de outubro de 2015

Eu não sou assim – Texto de Martha Medeiros

Quando você estiver discutindo com o amor da sua vida, adotando um tom alto demais porque precisa que ele entenda o tamanho do desespero que está sentindo, quando você, aos gritos, começar a trazer à tona coisas que ele fez muito tempo atrás a fim de incluí-las na sua argumentação, quando só lhe restarem palavrões na boca, quando você sentir que está perdendo a razão e também a compostura, acalme-se e diga para si mesmo: “Eu não sou assim”.

Se você não é barraqueira e nunca foi deselegante, contenha-se. É triste ter que se afastar tanto de si mesmo a fim de manter alguém próximo. Deixe-o ir, então. Ele partirá de qualquer jeito. Fique em você mesma.

Quando você estiver dizendo coisas que não tem vontade de dizer, quando sentir que está assumindo um personagem apenas porque é isso que a sua plateia está exigindo, quando você não reconhecer a autenticidade da própria voz, cale-se e pense: “Eu não sou assim”. Certamente a pessoa que está com você não deseja você, apenas alguém que você é capaz de interpretar. Deixe-a partir, se ela não se satisfaz com sua naturalidade, e simplesmente mantenha-se em si.

Quando você for impelida a trair porque não está mais vivendo a vida que sonhou, quando for induzida a mentir para que a casa não caia, quando sentir-se obrigada a arranjar desculpas para disfarçar o próprio desejo, pergunte-se: sou assim? Ardilosa, falsa, camuflada? Se você não é assim, se nunca foi assim, melhor enfrentar a verdade, como fazem os corajosos.

Quando você estiver num local que não lhe agrada, conversando com pessoas que não admira, rindo forçadamente de piadas que lhe soam grosseiras, quando estiver prometendo visitas que sabe que não fará, submetendo-se a situações bizarras ou vexatórias, escute o que seu desconforto está alertando: “Eu não sou assim”. Muitas vezes, especialmente no início da idade adulta, temos que nos adequar a certas contingências sociais se delas depende nossa sobrevivência, mas se você já percorreu um bom caminho, construiu uma vida digna e conhece a si mesma melhor do que ninguém, não precisa se moldar a mais nada, conquistou o direito de ser integralmente quem é.

Quando você estiver sendo condescendente sem receber em troca o carinho que merece, quando você perceber-se desacomodada no que deveria ser aconchegante, quando sentir que está se adaptando com dificuldade ao que não lhe convém, tente perceber se está sendo educada ou se está sendo submissa – não são sinônimos. Educação é básico, mas não exige docilidade fingida nem servilismo humilhante. Pegue sua bolsa e tome o rumo de casa sempre que estiver escutando de si mesma: “Eu não sou assim”.

A não ser que você seja.







quarta-feira, 18 de março de 2015

O Raciocínio Petista – Por : David Coimbra


O raciocínio dos defensores do governo é o seguinte:

Quem é a favor da ditadura é contra o governo.
Logo, quem é contra o governo é a favor da ditadura.

Ou:

Quem gosta do Bolsonaro é contra o governo.
Logo, quem é contra o governo gosta do Bolsonaro.

Ou:

Quem quer o golpe militar é contra o governo.
Logo, quem é contra o governo quer o golpe militar.

Ou:

Os tucanos são contra o governo.
Logo, quem é contra o governo é tucano.

Ou, o mais dissimulado de todos:

A maioria dos ricos e brancos é contra o governo.
Logo, todos os pobres e negros são a favor do governo, porque o governo é bom para pobres e negros, e mau para brancos e ricos.

E um último, embora vago, quase impalpável:

Este governo, supostamente, é de esquerda.
Logo, quem é contra este governo é certamente de direita.

Há muitas pessoas reproduzindo esse tipo de raciocínio sofístico e vagabundo. Essas pessoas, quase todas, são dadas a sofismas, sim. Mas não são vagabundas. Ao contrário: vejo gente que estuda, que trabalha, que se esforça e que quer o bem do Brasil tecendo esse gênero baixo de argumentação. Entre essas pessoas, inúmeros jornalistas. Alguns jovens, outros já na veterania, muitos bons profissionais, outros nem tanto, 90% deles decentes.

Vejo políticos dignos apelando para essa tergiversação, vejo homens e mulheres de boa índole, suaves no trato pessoal, alguns até inteligentes e razoavelmente informados.

Em parte, compreendo que se comportem assim. Porque não querem sentir-se ao lado de quem gosta do Bolsonaro, é de direita, a favor de golpes militares e contra negros e pobres, mas também porque estão no fervor da discussão, estão em busca de argumentos para não ceder a quem os ofende e os chama de petralhas ou o que quer que seja.

Mas a verdade já comprovada é que houve roubo neste governo, e o fato de ter havido em outros, tempos atrás, não consola nem atenua. Quando o governo atual é criticado, o é por uma razão simples: porque é o atual governo.

E o roubo não foi casual. Foi roubo sistemático, encaixado nas engrenagens da administração, sedimentado na base dos partidos governistas, disseminado por todos os setores que aceitassem fazer composição. Isso está demonstrado pelas investigações. Está plasmado. Vergonhosamente plasmado.

Duvido que Dilma tenha participado dessa roubalheira. Mas duvido que não soubesse dela. É impossível que uma mulher experiente na administração pública, tendo sido presidente do Conselho de Administração da Petrobras, ministra das Minas e Energia e da Casa Civil, sendo "mãe do PAC" no governo Lula e duas vezes presidente da República, é impossível que ela não soubesse do que ocorria. Da mesma forma, é impensável crer que Lula, o principal líder do PT, não soubesse de nada.

Ainda não é possível provar que eles sabiam, mas centenas de milhões de dólaressujos estão aparecendo por toda parte, as investigações estão se agudizando e o cerco vem se fechando a cada dia. Em pouco tempo, talvez não haja mais sofisma que sustente a defesa deste governo.

Sim, é verdade: alguns querem que o governo caia porque são canalhas. Mas também é verdade que muitos que não são canalhas se comportam como se fossem, para manter o governo de pé.



domingo, 14 de dezembro de 2014

O que você faria por amor?

Autor: Ivan Martins

Muita gente gosta de afirmar, em voz alta, que faria “qualquer coisa” por amor. Vocês já devem ter ouvido isso. Talvez até tenham dito a frase novelesca. Faz parte da nossa cultura. Outro dia, vi um rapaz dizer em rede nacional de televisão, com a maior naturalidade, que “mataria e morreria” por amor. O autor do exagero devia ter uns 18 anos, talvez menos. Deu vontade de rir, de tanto drama. O jovem Romeu da Tijuca ainda não descobriu que a melhor forma de amor se pratica entre vivos – preferencialmente em liberdade, que não estão na cadeia, presos por assassinato.

Isso não quer dizer que o amor não faça exigências terríveis. Eu mesmo já fiz cafunés de madrugada, cocei costas e apliquei massagens nos pés até ficar com as mãos exaustas. Por amor. Já lavei pias repletas de louça, fiz comidas sofríveis, fui ao mercado no domingo, tirei dinheiro do banco às sete da manhã e levei o lixo para fora vezes sem conta. Por amor. Já viajei ao exterior, dirigi até a praia, dancei até de madrugada e cantei até ficar rouco. Por amor. Alguns dirão que me faço de vítima. A verdade é que, por amor, já tomei vinhos excelentes, já comi em restaurantes caros, já assisti a espetáculos inesquecíveis e já comprei presentes que, só de lembrar, me enchem de alegria – e de uma vaga melancolia financeira.

Se alguém disser que isso tudo é pouco, talvez tenha a cabeça tomada por grandezas. Ou ache, como o Romeu da Tijuca, que amar é coisa de matar ou morrer, verdadeira luta com facas. O grande amor, ao contrário, é feito de miudezas. São gestos cotidianos, olhares cúmplices, uma mão que passa pela nuca e toca os cabelos enquanto a mulher que você ama conversa com outra pessoa. Amor também é feito de desejo, e a cada tanto exige a reafirmação de uma suave encostada - na pia, enquanto ela coa o café – e da barriga que toca o calor da outra barriga.

Esses sinais mostram amor como a temperatura denuncia a febre. Mas não são tudo.

Há também a conversa que atravessa os dias e dá sentido aos fatos da existência. E a lealdade, que permite contar com o outro nas horas sombrias. Ela impede que a gente se sinta sozinho num mundo de multidões solitárias. Não se pode esquecer a sacanagem, claro, sem a qual o amor morre de tédio. E o riso, em cuja ausência a morte se aproxima. No amor, se dizem as palavras mais doces, se dão os abraços mais ternos, se enxugam as lágrimas mais tristes, se grita, se geme. Nele, a gente se comove como o diabo. Em nada disso há heroísmo. Apenas a vida, em seus milagres comuns.

A única real grandeza do amor está em sua imensa vocação de fazer o outro feliz. Um dia depois do outro. Isso exige atenção, desvelo mesmo, e coisas como imaginação, tirocínio, esforço. Às vezes até sacrifício. O outro é tão complexo – tão desgraçadamente parecido conosco – que, às vezes, não sabe o que deseja e o que precisa. Conta conosco para iluminá-lo. Há que estar lá, portanto. Há que tentar entender com o coração e com as mãos, que apertam, seguram, amparam e acariciam.


Se me perguntam o que eu faria por amor – já me perguntaram, de outras formas –, eu responderia, como os portugueses, imenso. Cada vez mais, na verdade. Com calma e determinação, juntos, sem grandiloquência. Assim se lida com as coisas essenciais da vida. O amor, entre todas elas.