O raciocínio dos defensores do governo é o seguinte:
Quem é a favor da ditadura é contra o governo.
Logo, quem é contra o governo é a favor da ditadura.
Ou:
Quem gosta do Bolsonaro é contra o governo.
Logo, quem é contra o governo gosta do Bolsonaro.
Ou:
Quem quer o golpe militar é contra o governo.
Logo, quem é contra o governo quer o golpe militar.
Ou:
Os tucanos são contra o governo.
Logo, quem é contra o governo é tucano.
Ou, o mais dissimulado de todos:
A maioria dos ricos e brancos é contra o governo.
Logo, todos os pobres e negros são a favor do governo, porque o governo
é bom para pobres e negros, e mau para brancos e ricos.
E um último, embora vago, quase impalpável:
Este governo, supostamente, é de esquerda.
Logo, quem é contra este governo é certamente de direita.
Há muitas pessoas reproduzindo esse tipo de raciocínio sofístico e
vagabundo. Essas pessoas, quase todas, são dadas a sofismas, sim. Mas não são
vagabundas. Ao contrário: vejo gente que estuda, que trabalha, que se
esforça e que quer o bem do Brasil tecendo esse gênero baixo de argumentação.
Entre essas pessoas, inúmeros jornalistas. Alguns jovens, outros já na
veterania, muitos bons profissionais, outros nem tanto, 90% deles decentes.
Vejo políticos dignos apelando para essa tergiversação, vejo homens e
mulheres de boa índole, suaves no trato pessoal, alguns até inteligentes e
razoavelmente informados.
Em parte, compreendo que se comportem assim. Porque não querem sentir-se
ao lado de quem gosta do Bolsonaro, é de direita, a favor de golpes militares e
contra negros e pobres, mas também porque estão no fervor da discussão, estão
em busca de argumentos para não ceder a quem os ofende e os chama de petralhas
ou o que quer que seja.
Mas a verdade já comprovada é que houve roubo neste governo, e
o fato de ter havido em outros, tempos atrás, não consola nem atenua. Quando o
governo atual é criticado, o é por uma razão simples: porque é o atual governo.
E o roubo não foi casual. Foi roubo sistemático, encaixado nas
engrenagens da administração, sedimentado na base dos partidos
governistas, disseminado por todos os setores que aceitassem fazer composição.
Isso está demonstrado pelas investigações. Está plasmado. Vergonhosamente
plasmado.
Duvido que Dilma tenha participado dessa roubalheira. Mas duvido que não
soubesse dela. É impossível que uma mulher experiente na administração
pública, tendo sido presidente do Conselho de Administração da Petrobras,
ministra das Minas e Energia e da Casa Civil, sendo "mãe do PAC" no
governo Lula e duas vezes presidente da República, é impossível que ela não
soubesse do que ocorria. Da mesma forma, é impensável crer que Lula, o
principal líder do PT, não soubesse de nada.
Ainda não é possível provar que eles sabiam, mas centenas de milhões
de dólaressujos estão aparecendo por toda parte, as investigações estão se
agudizando e o cerco vem se fechando a cada dia. Em pouco tempo, talvez não
haja mais sofisma que sustente a defesa deste governo.
Sim, é verdade: alguns querem que o governo caia porque são canalhas.
Mas também é verdade que muitos que não são canalhas se comportam como se
fossem, para manter o governo de pé.