quinta-feira, 10 de março de 2011

O dia em que substituí meu cabeleireiro

Há anos cortava o cabelo com o mesmo cabeleireiro e fazia mãos e pés com a mesma manicure. Era assídua naquele salão. Pelo menos, uma vez por semana marcava minha hora e comparecia antes do horário marcado. Todavia, nos últimos meses notei certos descasos por parte deles. Por eu ser tão fiel, assídua, pontual e ser cliente antiga, já se davam o direito de atrasar o serviço (sempre lanchavam no meu horário ou, certos que eu não iria me importar por ser tão dependente deles, incluíam alguma cliente nova no meu horário e eu tinha de esperar). Enfim, com o passar dos anos, certos de me terem cativa, conquistada, já não se importavam mais em caprichar no atendimento. A rotina de me verem toda a semana e a repetição dos movimentos fez com que eles ficassem automatizados, transformando o serviço regular em acomodação. E a acomodação, em mau atendimento.  E a manutenção, quando não realizada de maneira conveniente, abre espaço para a concorrência.
E foi o que se sucedeu.
Ao voltar do feriadão de Carnaval, e propensa à renovação em todas as áreas da minha vida, inclusive em relação a pessoas, dei meu grito de liberdade e fiz o que achei correto: troquei de salão, de cabeleireiro e de manicure. Como cliente nova em outro salão, escolhido aleatoriamente, tive um atendimento espetacular. O corte ficou maravilhoso, as mãos e os pés perfeitos, porque eles tinham de dar o máximo para me agradar, para me conquistar, prender-me a uma rotina gratificante, tornar-me assídua e garantir meus reais semanalmente. E assim será durante vários dias, meses ou anos, até que também sejam substituídos, se também se transformarem em péssimos profissionais.
Sei que a rotina é essencial para a vida e pode ser a mola propulsora para grandes acontecimentos e mudanças de comportamento, mas pode se tornar perturbadora quando ocasiona certos dissabores e insatisfações.
Neste caso, há duas saídas: ou as pessoas se acomodam na mesmice dos atos e procedimentos por força do hábito, construindo barreiras que as impedem de criar momentos novos e restauradores para uma efetiva transformação na vida delas e na dos outros - e, por isso mesmo, correndo o risco de viver numa farsa enquanto sonham com o que poderia ser -, ou veem na rotina uma oportunidade de fazer algo diferente na construção da formação e da dignidade das pessoas, uma aprendizagem mais humana com seus semelhantes.
Não sou contra a rotina. Aliás, a rotina não existe se pensarmos mais filosoficamente (isso está se tornando um hábito na minha vida). O que existe são usos, práticas e normas gerais de procedimento que levam a caminhos percorridos e conhecidos – conforme a maioria dos dicionários –, e cada um atua conforme a criatividade, habilidade e originalidade com que encara o constante desafio que é renovar-se.
Portanto, rotina é algo que depende das pessoas, e não do tipo de vida que se leva. Como a rotina só existe para quem dá vida a ela, não pode ser a culpada por delimitar as pessoas. As pessoas é que se limitam nas ações rotineiras. Ao pôr a culpa de seus fracassos na rotina, vivem resmungando, queixando-se da vida que levam e, muitas vezes sentindo-se impedidas de viver com liberdade, cometem atos precipitados por não saberem como manter o que conquistaram ao longo do caminho.
Conforme Don Helder Câmara, “feliz de quem entende que é preciso mudar muito para ser sempre o mesmo”, mas as mudanças sempre devem ser de dentro para fora e não o contrário.
Até os atos mais simples, como trocar um salão de beleza por outro, podem ser mudados, desde que nos conduzamos com nobreza de caráter, espontaneidade e franqueza.
Se as pessoas não mudam, mudamos nós – já dizia o velho ditado.

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