quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

O QUE É SER NORMAL?

Estava, ontem, numa banca de revistas e, após escolher duas revistas voltadas à filosofia, a menina que estava no caixa me perguntou;
- Ler sobre filosofia é bom?
Respondi-lhe que filosofia era melhor que qualquer terapia.
- E o que a filosofia pode fazer por uma pessoa que precisa de tratamento psicológico?
Diante do interesse dela, discorri sobre como a filosofia influencia as pessoas de forma construtiva, fazendo com que contemplem as diversas opções que surgem em seus caminhos de maneira equilibrada. Que, às vezes, muitas pessoas nem precisam de antidepressivos ou de qualquer outro remédio que altere a química cerebral. Basta que saibam identificar o problema, voltarem-se para dentro de si mesmas a fim de analisá-lo (o problema) e pensar positivamente, extraindo algum tipo de ensinamento da adversidade.
Paguei pelas revistas e, quando estava saindo, a mãe dela chamou-me e, sussurrando, me disse:
- Minha filha é depressiva desde os 14 anos de idade (fiquei sabendo depois que ela tinha apenas 17 anos) e consulta com psiquiatra, pois ele acha (ele ACHA, ora essa) que ela tem tendência ao suicídio. Temo que agora ela vá querer abandonar a terapia, pois sempre falou que não é louca pra estar consultando com psiquiatras.
-Senhora – respondi-lhe – sua filha é linda, tem aparência saudável, trabalha, parece ser uma menina feliz. O que ocasionou a ida dela a um psiquiatra?
- É que um primo dela se suicidou quando ela tinha 14 anos. Como ficou muito abalada, levei-a a um médico. Como ele disse que ela estava em depressão por causa da morte do primo, receitou-lhe remédios e disse que era preciso também fazer terapia, pois, suicídios, podem ser mal de família. Como há um histórico de suicídio, então... blá...blá...blá...
Deus do céu, confesso que fiquei com pena daquela garota que parecia tão saudável e alegre, mas preocupada por estar sendo tratada como louca. Conheço pessoas equilibradas, mas não soube de alguma que estivesse feliz o tempo inteiro ou que não tivesse sofrido desânimos esporádicos por golpes da vida e angústias em períodos de crise. Também sei que a maioria delas conseguiu sobreviver sem medicamentos ou terapia.
Uns optam por ficarem reféns de médicos psiquiatras ou terapeutas charlatães, bem como de “fornecedores de sensações temporárias de felicidade”. Eu sempre optei pela liberdade de poder sentir a dor, seja de uma perda ou devido a uma frustração qualquer. Chamo a isso de “aguentar no osso”, mas não ceder ao infortúnio. Entre atirar-me no poço e afastar-me dele, sempre vou preferir dar um passo para trás, nesta ocasião. E mesmo que me sentisse no fundo do poço, não serio o caso de ter necessariamente alguma moléstia. Se fosse assim, pessoas em luto seriam presas fáceis para diagnósticos de doença mental. Remédios, portanto, não resolvem a agonia de alguém que está sofrendo: esta pessoa só precisa de alguém que a console, que a ouça ou de aconselhamento filosófico, se for o caso (saudades do Dr. Ênio Abreu, que curou muitas pessoas em pânico somente aconselhando-as filosoficamente).
Já me referi em outro post sobre a teoria de Martin Heidegger. As coisas só se revelem à consciência por meio da frustração que provocam. Neste caso, medicar uma pessoa que está passando por um momento difícil não é deixá-la alienada de si mesma?
Se tudo for levado ao pé da letra, ou seja, se continuarmos entrando sãos num consultório e saindo de lá com alguma doença mental diagnosticada, em breve seremos todos zumbis. Ou melhor: sobrará alguém normal? Será que, futuramente, não ser louco será considerado outra forma de loucura, conforme vaticinou Blaise Pascal?
Penso que é preciso haver moderação por parte dos médicos que prescrevem tais paliativos para pessoas com problemas psicológicos sem causa específica e sem sintomas claros de moléstia.  Estar triste não pressupõe transtorno mental. É preciso saber distinguir o padrão de funcionamento de cada um (personalidade) de um transtorno ou neurose (quando uma pessoa pode agir de modo a causar sofrimento ou prejuízos em si mesmo ou em outrem).
Enfim, se você não é boderline, narcisista, paranoide, antissocial, psicopata, fóbico, histérico, obsessivo ou esquizoide, considere-se normal e procure pôr mais filosofia em sua vida quando estiver num mau momento.
E como é possível atingir a estabilidade emocional?
- deixando a infantilidade de lado, tolerando as frustrações e não querendo tudo pra ontem. Todavia, irritar-se porque foi mal atendido num restaurante ou com alguém que furou a fila, não o transforma num paranoide.
- usar seus recursos naturais, como experiência e inteligência, para corrigir, constantemente, o seu modo de agir.  Seja fiscal de si mesmo e busque por autoconhecimento;
- tentar ser razoável com os seus desejos e com as demandas do mundo externo. Não adianta se agoniar por não ter ou não ser tudo o que deseja e admira. Apenas os narcisistas sentem vontade de morrer por causa de um joanete;
- manter o equilíbrio emocional e tentar adaptar-se às dificuldades da vida. É justo sofrer e chorar, mas sem transformar-se num monstro. Tentar matar seu cônjuge porque foi traído, torna-o um psicopata irreversível. Saiba sofrer com dignidade.
- ter prazer nos vínculos sociais, familiares e nas experiências compartilhadas.
Enfim, querer viver a vida em toda a sua plenitude, e de maneira responsável, saudável e equilibrada, também não deixa de ser uma loucura. Mas é dessa loucura boa que precisamos.
Se tiverem tempo e ainda olhos saudáveis, assistam a esse vídeo interessante.
Antes disso (poupem mais um pouco os seus olhos), é importante saber que, conforme pesquisa, da primeira edição do DSM (Manual Diagnóstico e Estatístico dos Problemas Mentais), em 1952 eram apenas 106 doenças mentais diagnosticadas. A edição de 2000 já relata 365 casos. Só Deus sabe quantas mais surgiram até 2011. Se eu revelar a algum médico que me irrito quando alguém chuta a minha cadeira num cinema, serei diagnosticada como “hostil” e talvez receba alguma receita para aliviar minha paranoia.

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