sábado, 23 de julho de 2011

Nesta Fantasia

Preocupa-me o fato de vivermos numa sociedade onde a riqueza é considerada o principal veículo para uma vida feliz.  Até mesmo nossos governantes acham que a felicidade está correlacionada com crescimento econômico, ou seja, quanto mais dinheiro à disposição, maior o volume das posses, melhor qualidade de vida e, consequentemente, pessoas mais felizes. Por isso é que criou programas como “Fome Zero” e o “Bolsa-Família”.

Hoje em dia, beneficiados por uma ampliação do volume de dinheiro e créditos disponíveis, as pessoas têm adquirido mais. E quanto mais o dinheiro trocar de mãos, maior será o índice do PNB (Produto Nacional Bruto).

O “pibão”, como Dilma costuma referir-se ao PNB, foi muito bom no ano de 2010. A riqueza gerada ficou em torno de R$ 3,675 trilhões, o que fez com que o PIB (Produto Interno Bruto) per capita ficasse em R$ 19.016, graças aos “estímulos” dados pelo governo.

As pessoas são muito mais felizes agora, segundo o PT da Dilma, e o consumismo se transformou numa atividade absorvente: há mais pessoas comprando a casa própria (Minha Casa, Minha vida), geladeiras, televisores de LCD, carros, acesso à Internet com baixo custo, etc.

Estranhamente, paralelamente aos indicadores de nível de riqueza, também cresce um indicador social alarmante: a taxa de criminalidade, medida pelos roubos a residências e de automóveis, tráfico de drogas, suborno e corrupção no mundo dos negócios.

Como podem os indicadores de crescimento representar apenas o aumento das riquezas e não o declínio da felicidade e da satisfação humana?

As estatísticas do PNB avaliam o crescimento ou declínio da disponibilidade dos produtos e da quantidade de dinheiro que mudou de mãos no curso de transações de compra e venda, mas não conseguem avaliar o nível de satisfação humana, essa é a verdade.

O PNB não mede o crescimento de usuários de antidepressivos, as vítimas de trânsito e nem os problemas que a falta de água potável acarretará caso a população continue a crescer de maneira desenfreada devido aos inúmeros estímulos da natalidade - O Bolsa-Família era pago para quem tivesse até três filhos. Agora o número subiu para até cinco filhos.

Em 18 de março de 1968, o presidente dos EUA, Robert Kennedy, no auge de sua campanha presidencial, lançou um ataque mordaz à mentira em que se baseia a avaliação da felicidade com base no PNB:

Nosso PNB considera em seus cálculos a poluição do ar, a publicidade do fumo e as ambulâncias que rodam para coletar os feridos em nossas rodovias. Ele registra os custos dos sistemas de segurança que instalamos para proteger nossos lares e as prisões em que trancafiamos os que conseguem burlá-los. Ele leva em conta a destruição de nossas florestas de sequoias e sua substituição por uma urbanização descontrolada e caótica. Ele inclui a produção de napalm, armas nucleares e dos veículos armados usados pela polícia para reprimir a desordem urbana. Ele registra programas de televisão que glorificam a violência para vender brinquedos a crianças. Por outro lado, o PNB não observa a saúde de nossos filhos, a qualidade de nossa educação ou a alegria de nossos jogos. Não mede a beleza de nossa poesia e a solidez de nossos matrimônios. Não se preocupa em avaliar a qualidade de nossos debates políticos e a integridade de nossos representantes. Não considera nossa coragem, sabedoria e cultura. Nada diz sobre nossa compaixão e dedicação a nosso país. Em resumo, o PNB mede tudo, menos o que faz a vida valer a pena”.

Que além do PNB também sejam avaliados os nossos desassossegos. É o mínimo que peço para que possamos viver num  mundo mais justo, mais livre, emocionante e belo.

E porque estou repleta dessas fantasias utópicas é que posto a música Nella Fantasia.

Nesta fantasia eu vejo um mundo justo
Ali todos vivem em paz e em honestidade
Sonho que seus habitantes são sempre livres
Como as nuvens que voam
Repletas de humanidade dentro da alma...




Fonte consultada: A Arte da Vida, Zygmunt Bauman.

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